Estações sísmicas de fundo oceânico (OBS) desenvolvidas no IDL são peças fundamentais em projeto europeu
O Observatório Europeu Multidisciplinar do Fundo do Mar e da Coluna de Água (EMSO), enquanto Consórcio Europeu de Infraestruturas para a Investigação (ERIC), consiste num conjunto de instalações regionais localizadas ao longo de toda a costa europeia, incluindo os Mares Negro e Mediterrâneo, com o objetivo de monitorização dos processos ambientais marinhos relacionados com a interação entre a geosfera, a biosfera e a hidrosfera. Trata-se de plataformas equipadas com múltiplos sensores, instalados no fundo do mar e ao longo da coluna de água, com o intuito de medir diferentes parâmetros biogeoquímicos e físicos com implicações na mitigação de desastres naturais e na monitorização das alterações climáticas e dos ecossistemas marinhos.O observatório português (EMSO-PT), coordenado pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), pretende a aquisição de dados bióticos e abióticos do fundo oceânico e coluna de água, concretamente temperatura, oxigénio dissolvido, turbidez, som e correntes. O Instituto Dom Luiz (IDL), da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), enquanto parceiro, é responsável pelo desenvolvimento e construção de estações sísmicas de fundo oceânico (vulgarmente conhecidas como os OBS – Ocean-Bottom Seismometers), instrumentos capazes de registar o movimento do solo e o som no oceano, podendo, a partir deles, inferir informação meteorológica, oceanográfica e ambiental, sendo ainda possível que incluam equipamento capaz de recolher dados biogeoquímicos. A equipa do IDL por trás do desenho, desenvolvimento e construção de protótipos é dirigida por Carlos Corela, sendo composta por Afonso Loureiro e José Luís Duarte. O Projeto DUNE (PTDC/EAM-OCE/28389/2017), onde Carlos Corela é o Investigador Principal, permitiu estudar e desenvolver todas as soluções técnicas adotadas nestes OBS construídos para o Projeto EMSO.A campanha oceanográfica EMSO-PT Leg 1 teve lugar ao largo da costa sudoeste de Portugal Continental entre 23 e 26 de maio, a bordo do navio de investigação Mário Ruivo. Durante a campanha, entre outras tarefas previstas no EMSO-PT, foram lançados três OBS, naquela que é uma das regiões de maior atividade sísmica do território português: dois deles equipados com um sismómetro de banda larga, um com um acelerómetro e todos contendo um hidrofone. Adicionalmente, cada OBS levava também meios de cultura para estudar as populações de bactérias bentónicas, como parte da tarefa a cargo da equipa liderada pelo Prof. Belarmino Barata, do Departamento de Química e Bioquímica da FCUL. Está disponível um diário de bordo de síntese da campanha e o registo em vídeo do lançamento de um dos OBS pela equipa do IDL.Nesta missão, os OBS foram colocados a profundidades diferentes conforme a sua localização: no planalto de Sagres a cerca de 3000 m; no planalto do Marquês de Pombal a 2000 m; junto à falha Pereira de Sousa a 1200 m. No final da missão, que se prevê ter lugar em novembro deste ano, estes aparelhos terão registos de vários meses da sismicidade local e a sua triangulação permitirá localizar a origem dos eventos e a sua magnitude, estendendo, dessa forma, para o oceano a rede de observação terrestre.O hidrofone regista frequências altas, sendo ideal para a gravação de vocalizações de mamíferos marinhos (20-130 Hz). Regista igualmente a atividade sísmica e a partir dos seus dados é possível inferir parâmetros oceanográficos (o período e a altura das ondas, intensidade das correntes de fundo) e meteorológicos (o vento à superfície). As medições de natureza diversa obtidas por estes instrumentos e a sua configuração abrem portas a uma caracterização minuciosa da dinâmica do fundo marinho desta região.A sensibilidade dos sensores que integram um OBS, bem como a sua colocação no fundo do mar, obriga a uma série de precauções técnicas, concebidas e executadas pela equipa. Os OBS descem a uma velocidade de 1 m/s, mas é possível que, devido à topografia do fundo marinho, fiquem inclinados. Para lidar com estes casos, os instrumentos dos OBS incluem sensores de orientação para correção dos registos. Para além disso, todos os componentes têm uma frequência de ressonância que pode ser registada como sinal espúrio e que por isso precisa de ser mitigada ou anulada, neste caso pela carcaça exterior da estrutura. É esta alta sensibilidade que permite o registo de ondas gravíticas geradas por tempestades no oceano a milhares de quilómetros de distância.O equipamento, que no seu total pesa 175 kg fora de água e 30 kg em imersão, inclui ainda um datalogger com autonomia até um ano e meio, uma antena rádio, uma luz que se ativa no final da missão, quando a estrutura chega à superfície, e duas a quatro esferas de vidro para efeitos de flutuação, para além da esfera estanque que contém os sensores sísmicos. Um OBS pode ser lançado para uma profundidade máxima de 6000 m. Na altura da recuperação, será emitido um sinal acústico para que o equipamento se liberte do lastro e inicie a sua subida até à superfície. Quando o OBS atinge a superfície, pode ser localizado com a ajuda de uma bandeira, da luz e do sinal de rádio, que apenas se ativam nessa altura. O lastro de ferro é abandonado no fundo, mas será completamente corroído no espaço de alguns meses a anos, dependendo do grau de atividade das bactérias quimiotróficas.A equipa do IDL dedica-se à construção de OBS desde 2004, participando desde então em 1-2 campanhas por ano. O desenvolvimento e construção do equipamento vai evoluindo à medida que as tecnologias e os recursos vão avançando. Um dos mais importantes contributos que este instrumento providencia é o aumento e a melhoria da informação sobre a atividade sísmica no Sudoeste da Ibéria, anteriormente monitorizado apenas por estações sísmicas em terra. A triangulação com os OBS vai permitir identificar de forma mais precisa a origem dos sismos que ocorrem na região.Uma das próximas missões em que estes cientistas participarão é sob a alçada do projeto UPFLOW (Upward mantle flow from novel seismic observations), liderado pela sismóloga Ana Ferreira da University College London (Reino Unido), cujo financiamento foi obtido através de uma “Consolidator Grant’, atribuída pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC). O projeto pretende estudar a litosfera e o manto na região que vai da Crista Média Atlântica até às Canárias, passando pelos arquipélagos dos Açores e da Madeira. Tem como objetivo compreender o fluxo ascendente no manto e qual o seu papel na origem dos arquipélagos dos Açores, da Madeira e das Canárias. Tratar-se-á de uma experiência sísmica passiva, com o auxílio de 50 OBS, que permitirá uma resolução da ordem dos 100-200 km, até uma profundidade de cerca de 1000-1500 km. A duração prevista da missão é de 14 meses e a primeira viagem de colocação dos instrumentos está agendada para começar a 14 de julho, com final marcado para daí a um mês. A dimensão espacial e temporal sem precedentes desta missão proporcionará uma recolha extensiva de dados que poderão ajudar a desvendar processos e fenómenos no interior da Terra nesta zona de forte atividade sísmica e vulcânica a um nível nunca antes alcançado.