6º Relatório Climático IPCC: resumo dos resultados
O Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) lançou no início deste mês o primeiro de quatro relatórios que compõem o 6º Relatório de Avaliação, referente à ciência do clima (Working Group I). Aqui ficam os destaques dos cientistas que contribuíram para este trabalho.
As recentes alterações no clima são generalizadas, são céleres, estão a intensificar-se e não têm precedentes nos últimos milhares de anos. É indiscutível que as alterações climáticas que observamos têm origem na actividade humana.
A influência humana provocou um aquecimento global a uma taxa sem precedentes em pelo menos 2000 anos. O aquecimento observado é causado por emissões oriundas de actividades humanas, sendo que o efeito de estufa está parcialmente mascarado pelo arrefecimento devido à presença de aerossóis na atmosfera.
Figura 1. Alterações na temperatura global à superfície relativamente ao período 1850-1900.a) Mudança da temperatura (média decadal) reconstruída (1-2000, a cinzento) e observada (1850-2020, a preto).b) Mudança da temperatura (média anual) observada (a preto) e simulada tendo em conta apenas factores naturais (solares e vulcânicos, a azul) e factores naturais + antropogénicos (a castanho) (período 1850-2020).
Figura 2. Esquema de quantificação das principais alterações constatadas: (da esquerda para a direita)- Concentração de CO2: mais alta em pelo menos 2 milhões de anos;- Subida da altura média do nível do mar: as taxas mais elevadas em pelo menos 3000 anos;- Área de gelo do Ártico: mais baixa em pelo menos 1000 anos;- Recuo dos glaciares: sem precedentes em pelo menos 2000 anos.
A menos que haja reduções nas emissões de gases de efeito de estufa imediatas, rápidas e em larga escala, o aquecimento global ultrapassará os 1,5ºC.
Quanto maior o incremento no aquecimento, mais fortes as alterações no clima. Por exemplo, a precipitação extrema intensifica em 7% por cada 1ºC de subida de temperatura global.
Figura 3: Diferenças de temperatura observadas (a preto) e simuladas (a cores, uma por cenário diferente de emissões - ver Fig. 4).
A curto e médio prazo, só num cenário de emissões de CO2 "muito baixas" (azul claro) se conseguiria limitar o aumento global de temperatura a 1,5ºC. O limiar de 2ºC alcançar-se-ia no cenário seguinte de emissões baixas (azul escuro).
Figura 4. a) Emissões anuais futuras de CO2 (esquerda) e outros forçadores do efeito de estufa(direita - metano, óxido nitroso, um tipo de aerossol) em 5 cenários ilustrativos.b) Contribuição para o aumento da temperatura global dos 5 cenários diferentes:aquecimento total (a escuro o aquecimento já observado nos dias de hoje),CO2, outros gases de efeito de estufa e aerossóis.Alteração à temperatura global à superfície em 2081-2100 relativamente a 1850-1900 (ºC).
Figure 5. Total acumulado de emissões de CO2 absorvida pela terra e pelos oceanos (cor)e que permanece na atmosfera (cinzento) sob os 5 cenários ilustrativos de 1850 a 2100.
Em cenários com acumulação mais elevada de CO2, a quantidade de CO2 com sumidouro em terra e nos oceanos é maior, mas há uma maior quantidade de CO2 emitida que permanece na atmosfera, ou seja, a proporção emissão/absorção é inferior em cenários com emissões mais elevadas de CO2
A actividade antropogénica está a tornar mais frequentes e mais severos eventos climáticos extremos, tais como ondas de calor, precipitação intensa e secas.
A actividade antropogénica é o principal responsável nos seguintes fenómenos:• Extremos de calor, que têm vindo a tornar-se mais frequentes e mais intensos;• Aquecimento do oceano desde a década de 1970 e acidificação do oceano;• Alterações nas regiões congeladas do planeta;• Recuo global dos glaciares desde a década de 1990;• Decréscimo de 40% de gelo no Árctico desde 1979;• Descréscimo de cobertura de neve na Primavera desde a década de 1950.
Figura 6. Frequência e aumento de intensidade de eventos extremos:temperaturas elevadas sobre terra; precipitação intensa sobre terra; secas agrícolas e ecológicas em regiões áridas.Os períodos de comparação são 1850-1900, o presente com 1ºC a maise três incrementos diferentes de temperatura global: 1,5ºC, 2ºC e 4ºC.
Cada um dos eventos ocorria uma vez em cada dez anos (ou cinquenta para extremos de temperatura) num mundo sem influência humana.
Figura 7. Número de regiões terrestres e costeiras (a) e de oceano aberto (b) onde se prevê o aumento (roxo) ou diminuição (laranja) de vários forçamentos climáticos, com fiabilidade elevada (escuro) ou média (claro). Temperatura: temperatura média à superfície; calor extremo; vaga de frio; geada. Humidade: precipitação média, cheias de rio, precipitação intensa e inundações; derrocadas de terra; aridez; seca hidrológica; seca agrícola e ecológica. Vento: propício a fogo; velocidade média do vento; vendaval severo; ciclone tropical; tempestade de areia e pó. Neve & gelo: neve, glaciares e camada de gelo; gelo permanente; gelo marinho, fluvial e lagunal; queda de neve intensa e tempestade de gelo; granizo; avalanche. Vários: propício a poluição de ar; CO2 atmosférico à superfície; radiação à superfície. Costeiro: nível relativo do mar; cheias costeiras; erosão costeira; ondas de calor marinhas; acidez do oceano. Oceano aberto: temperatura média do oceano; ondas de calor marinhas; acidez do oceano; salinidade do oceano; oxigénio dissolvido.
As alterações climáticas já afectam todas as regiões da Terra, de diversas maneiras e com impactos diferentes.
Figura 8. Síntese da avaliação de alterações regionais observadas em(a) extremos de calor, (b) precipitação intensa e (c) seca agrícola e ecológica,bem como da confiança na contribuição humana nestas alterações (de uma bola a três bolas pretas).Aumento: rosa/verde; diminuição: azul/amarelo.
Algumas alterações no sistema climático são irreversíveis. No entanto, outras poderão ser abrandadas ou evitadas limitando o aquecimento global.
Figura 9. a) Alteração da temperatura média anual devido a um aquecimento global de 1ºC: observado (esquerda) e simulado (direita); Alteração da temperatura (b), precipitação (c) e humidade na totalidade da coluna de solo (desvio-padrão) (d) simulada (médias anuais) relativamente ao período 1850-1900 devido a um aquecimento global de 1,5ºC (esquerda), 2ºC (centro) e 4ºC (direita).
O aquecimento já constatado de 1ºC afecta todos os continentes e é em geral mais elevado sobre terra do que sobre oceano, tanto nas observações como nos modelos. Na maioria das regiões, os padrões observados e simulados são consistentes.Nos diferentes cenários de aquecimento, as áreas terrestres aquecem mais do que as áreas marinhas, e o Árctico e a Antárctida aquecem mais do que os trópicos.As projecções de precipitação revelam um aumento nas latitudes elevadas, no Pacífico equatorial e em parte das regiões de monção, e um decréscimo em certas zonas subtropicais e em áreas delimitadas nos trópicos.Alterações absolutas relativamente pequenas em precipitação podem revelar-se alterações percentuais elevadas em regiões áridas ou semi-áridas.Nas diferentes projecções, a humidade do solo obedece no geral às alterações na precipitação, embora existam diferenças devido à influência da evapotranspiração.Da mesma forma, alterações absolutas relativamente pequenas podem revelar-se elevadas quando expressas em unidades de desvio-padrão em regiões áridas com pouca variabilidade interanual.
Para limitar o aquecimento global são necessárias reduções drásticas, rápidas e consistentes nas emissões de CO2, metano e outros gases de efeito de estufa.
Estas não só reduziriam as consequências das alterações climáticas, como melhorariam a qualidade do ar.
Figura 10. Aumento da temperatura global à superfície desde 1850-1900 (ºC) como função de emissões acumuladas de CO2 (Gigatoneladas) histórico (preto/cinzento) e para os cinco cenários (cores).As emissões acumuladas de CO2 são diferentes para cada cenário e determinam o aquecimento a que estaremos sujeitos.
O clima a que estaremos sujeitos no futuro depende das nossas decisões agora.
Cada grau de aquecimento conta. Já em 2018 o IPCC defendia que, para limitar o aquecimento global a 1,5ºC, seria preciso medidas drásticas e céleres. Agora, face aos numerosos eventos climáticos extremos com consequências trágicas a acontecer um pouco por todo o mundo, com a população a sofrer em primeira mão os impactos das alterações climáticas, torna-se cada vez mais difícil ignorar os avisos. Em Novembro de 2021 realizar-se-á a 26ª Conferência para as Alterações Climáticas das Nações Unidas, onde as estratégias de mitigação deverão ser definidas à escala mundial e onde os governos de todos os países poderão comprometer-se a combater este fenómeno planetário. O sumário para decisores políticos pode ser lido na íntegra aqui. Neste 6º relatório, foi disponibilizado também um atlas interactivo, uma nova ferramenta para análises espaciais e temporais desta informação climática, tanto observada como modelada, que foi o foco do trabalho do WG I.O IPCC foi criado em 1988 pelas Nações Unidas com o intuito de fornecer avaliações científicas regulares sobre as alterações climáticas aos decisores políticos, bem como as suas implicações e riscos futuros, e fomentar o desenvolvimento e a implementação de estratégias de adaptação e mitigação. O primeiro relatório foi elaborado e emitido em 1990.